Em um dia em qualquer dia, às sombras tênues do meio dia,
Ressurgia assim celeste, os sonhos de uma alegria, enquanto
O motor de um barco, simples vapor de fato desmaiado junto
Ao vento, me aturdia, assim continuo, ao ritmo do pensamento,
Que me dizia em sombria leveza, talvez angústia precoce
De certo pressentimento, uma palavra amarga de tristeza,
Ao me deparar com os cais iluminados pelos reflexos do
Canais, quando a certeza me levava, e junto ao meu lado,
Meu amado, ao Gritti Palazzo de Venezia....ela me dizia e
Confundia a inominável absoluta certeza com uma lágrima
negra
Inenarrável, cobrindo a inexpugnável resistente Beleza
Com essa tal lágrima amarga, severa flor da peste negra,
Uma lágrima de tristeza.....
Desembarcamos livres, soltos das pesadas malas, dos
Pesos inominados, alguns trazidos pelos excessos, outros
Como sombras de um passado amaro, mas mesmo desembarcados,
E envoltos pela infinda Beleza, porém assim mesmo surtia
algo deste
Inominável silêncio entorno de tudo que nós olhávamos,
Quando no marmóreo balcão nos registrávamos, a negra
Pena o papel rasgou, sem querer derrubei o tinteiro negro
Sobre a brancura ilustre da pedra alva, e ali, talvez
novamente
A tal certeza, uma lágrima da tristeza, escorria silenciosa,
O primeiro pranto desaguando seu choro pelo grande lacrimoso
canal, a cidade atemporal, imortal Veneza nupcial....
Ao quarto conduzidos fomos, por talhadas esculturas
perfeitas,
Seres humanos vestidos ao porte de uma altura onde nuvens
Estariam rarefeitas, as belezas todas perfeitas, e os
lustres de cristal,
A mobília veneziana, o tecido rosa tão dial escalando as majestosas
paredes, e as taças seminuas, nos esperando na varanda, resfriando
o contido fogo de nosso incontido temporal corpóreo, dias
que pareciam anos, quando da última vez nossa peles se disseram adeus, nossos
olhos choraram
As lágrimas de Deus, e esparziram sobre o mundo a leveza disseminável,
Do sentimento mais puro inconstante numa vida perdurável,
quando
Impertinente o vento
entrou, e um taça se quebrou, talvez ai novamente a silenciável e aturdida
Beleza inexpugnável, chorava uma vez mais despercebida,
Em nossas núpcias de Veneza, as lágrimas dos canais, derramando
uma solene lágrima de tristeza....
O dia se perdia sem perder-se das horas a alegria, o tempo
não parava pois
Simplesmente não existia, e tudo entorno de nós era gozo
interminável, era
A Beleza em sua mais pura forma de grandeza, os olhos que não
se fecham
Sequer quando a luz do dia na escuridão se dissolvia, os
lábios que não se afastavam sequer quando as estrelas se apagavam na solidão
imensa do inescrutável, era isto o que vivia-se naquilo que podia se dizer ser
inenarrável, era isso o que tínhamos nas mãos sob algo que podia se dizer ser
irrefreável, os olhos puros da Beleza, nos fitando diretamente, flutuando sem
piscar sobre os incontáveis canais de um sonho de Veneza, a alma e sua certeza,
sem nada mais precisar, do que um silêncio gondolar e um barqueiro para assim
nos trafegar pelos infinitos segredos de uma cidade flutuante, onde dois são
navegantes
Passageiros, de algo transitório que nos toca por um
instante, fazendo
De uma vida inteira um inefável momento, uma Beleza
triunfante, para sempre
Eternizada em vosso olhar, meu pequeno diamante a flutuar
sobre os meus
Sonhos venezianos, cintilantes em imperecíveis aquáticos corantes,
quando a vida vira um sonho, e o sonho um brilho faiscante nos teus expressivos
olhos de esmeraldas fervilhantes, a viva pedra mais preciosa do mais belo jovem
dos amantes....e sua certeza inabalável, quando brutalmente a gondola
Bateu na pedra silenciosa e a travessia interrompida foi,
cortado o silencio
Da lua esmaecida, tivemos que desembarcar, talvez ai,
novamente diante
De tanta Beleza, o silêncio tumular, chorou secretamente,
insinuante, mais uma
Lágrima, da peste lagrimosa, a lágrima de Veneza....
As luzes faiscantes nos canais, as tochas e as pontes, as
janelas recortadas como
Arcos flamejantes, as floreiras cravejadas nos tijolos
desnudos dos templos flutuantes, as enormes cúpulas imponentes trovejantes, as
torres e os amantes, tudo isso no cenário da nossa grande beleza, um silêncio
para sempre tatuado
Na carne da memória, nessa vida de surpresas, quando
retornamos ao quarto
Quente, nossa pequena íntima realeza, o vulto silencioso já
estava lá, nos esperando na cadeira, invisível como um fato do passado
esmaecido pelo tempo, como um belo rosto envelhecido, o rosto da Beleza
esculpido pelo vento, o tempo e o sentimento de apagar o belo rejuvenescimento
daquilo que vive sem a devida manutenção, sem o devido sentimento, a lágrima
dos olhos, esquecidos, do amor em solidão.... ele estava lá, impregnado nas
paredes, e bastou um ato, um gesto, um olhar, um nada detonador, um pensamento
falho como gatilho para indescritível explosão! As velas apagaram-se na mesa,
os espelhos quebrados manchados pelo sangue negro da escuridão, a morte da
Beleza...enfim choravam os anjos alvejados, para sempre desterrados, morriam
sem saber, impregnados pela tal tristeza,
Choravam juntos, com medo, abraçados, a luz do abajur acesa
num recortável silêncio nupcial...
As Eternas Lágrimas de Veneza
FC